Portanto, o que pretendo abordar é
fruto de uma ansiedade e necessidade por novos olhares enquanto militante que
não ver uma solução que de fato conforte os corações dilacerados pelo racismo.
James Aggrey, educador africano, criou
esta bela história sobre “A águia e a galinha”.
“Era
uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo
cativo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Colocou-o no
galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração própria para galinhas.
Embora a águia fosse o rei/rainha de todos os pássaros. Depois de cinco anos,
este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista. Enquanto passeavam
pelo jardim, disse o naturalista: - Esse pássaro aí não é galinha. É uma águia de
fato – disse o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais
uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar das asas de quase
três metros de extensão. Não! – retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma
águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às
alturas.– Não, não – insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como
águia. Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a
bem alto e desafiando-a disse:- Já que você de fato é uma águia, já que você
pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe! A águia pousou sobre
o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as
galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas. O camponês
comentou: - Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha! Não! – tornou a insistir o naturalista. Ela é
uma águia. E uma águia será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente
amanhã. No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa.
Sussurrou-lhe: Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe! Mas quando
a águia viu lá embaixo as galinhas ciscando o chão, pulou e foi para junto
delas. O camponês sorriu e voltou à carga: - Eu lhe havia dito, ela virou
galinha! Não – respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre
um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei
voar. No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram
a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de
uma montanha. O sol nascente dourava os picos das montanhas. O naturalista
ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe: - Águia, já que você é uma águia, já
que você pertence ao céu e não à terra, abra suas asas e voe! A águia olhou ao
redor. Tremia como se experimentasse nova vida. Mas não voou. Então o
naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos
pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte. Nesse
momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou com o típico kau-kau das águias
e ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a
voar cada vez para mais alto. Voou... voou até confundir-se com o azul do
firmamento...”
A
história narrada acima elucida a necessidade que nós pret@s no Brasil temos
hoje de ser motivados para voos cada vez mais altos. Digamos que ainda hoje
somos uma águia criada como se fosse galinha e que algum naturalista venha
mergulhar em nossa realidade e nos fazer descobrir quem nós somos realmente e o
que podemos fazer de tão grande por nós mesmos.
Assim,
falar do nacionalismo preto neste momento atual em que vive o movimento negro
no Brasil é desvendar a possibilidade do surgimento de uma nova geração e
caminhos de militância e ativismos pretos focados num projeto de libertação
negra real.
Este
é o compromisso da mensagem a ser transmitida esta tarde.
______________________________________________________________________
Antes
de fazer uma retrospectiva da origem e formas deste movimento revolucionário que
representou uma quebra de paradigma na história de levante anti racista do povo
preto na américa do norte, necessário dizer que o nacionalismo preto nada tem
haver com as formas de nacionalismo de estado que concebemos hoje.
Enquanto
o nacionalismo de estado envolve elementos primários e secundários, quais
sejam, a existência de um único grupo ético, um único idioma, mesmos costumes, unidos pelos hábitos, tradições, religião,
língua e consciência nacional, o nacionalismo preto é um movimento fincado na noção
de raça e origem ancestral, em muitos dos casos, focado na exclusividade da
relação entre a raça negra e o movimento messiânico de um povo que fora
escolhido por Deus para dominar toda a terra, para promover a justiça,
igualdade e o amor.
O
nacionalismo preto é um movimento pela libertação territorial do povo preto das
amarras da dominação e opressão dos brancos, remontando-se a sua origem ao século
XIX, quando líderes pretos, como o pastor Robert Finley, Paull Cuffe e Martin Delaney, convencidos de
que os pretos nunca encontrariam a verdadeira igualdade nos estados Unidos,
advogaram a migração através do oceano, ou seja, o retorno dos pretos para a
África.
No
limiar do século XX, Booker T. Washington e seus seguidores, pregaram uma
solidariedade racial, uma auto suficiência econômica e auto ajuda negra. Logo
após a primeira guerra, milhões de americanos pretos foram atraídos pelo
chamado de Marcus Garvey, criador da UNIA (Associação Universal Para o
Progresso das Pessoas de Cor), para engrossar uma luta por igualdade e também
plantar uma bandeira de liberdade no continente africano.
Concomitantemente
ao Garveymo, foram os movimentos separatistas dos mulçumanos pretos e dos
hebreus pretos quem ditaram a tônica do nacionalismo preto. Nobre Drew Alí, da
Carolina do Norte, fundou o Templo de Ciência Mourisco Norte Americana em 1913.
O movimento dos Hebreus Pretos se instalou no Harlem e foi, de certa forma, uma
das influência para o surgimento do movimento Harlem Renaissance na década de
30 neste mesmo bairro.
Destaque
merecido para o Harlem Renaissance - O Renascimento do Harlem, ou Novo
Movimento Negro, como foi originalmente batizado, fruto do nacionalismo pret,
foi o florescimento da literatura e da arte afro-americanas nas vizinhanças do
Harlem, em Nova York, nos anos 20 e começo dos 30. O palco desse renascimento
foi montado quando milhões de negros sulistas recém-libertados, depois de
suportar os sofrimentos da escravidão e da Reconstrução no século XIX, se
mudaram para Nova York e outras cidades do norte, num êxodo conhecido como
Grande Migração. N o final da Primeira Guerra Mundial, uma comunidade negra
pobre, mas culturalmente vibrante, havia criado raízes no Harlem.
O pensamento de Nobre Drew Alí
expõe a necessidade de libertação territorial / física dos pretos nos Estados
Unidos. E dizia: “Para um povo chegar a
valer alguma coisa deve ter um nome (nação) e território”.
No
entanto, foi com a criação da Nação do Islã, surgida em Detroit em 1930, durante
a crise econômica americana, que o nacionalismo preto atingiu seu auge, quando
centenas de jovens começam a ser iluminados pela palavra de desbloqueio e
libertação do islã separatista.
Os
aspectos extrínsecos ao movimento foram dois. Primeiro foi um movimento baseado
no emigracionismo racial, ou seja, na idéia da volta, do regresso, dos negros
para a África. Depois, em virtude da inviabilidade da política do regresso ao
continente mãe, tornou-se um movimento pela criação de um Estado Independente,
ou seja, focado na criação de um território autônomo para os pretos viverem no
Ocidente.
Duas
frases de dois dos grandes líderes das duas vertentes do movimento, transcrita
abaixo, merecem ser lidas:
Pensamento
de Marcus Garvey sobre o emigracionismo para África: "Onde
está o governo do homem preto? Onde se situa seu Rei e seu Reino? Onde está seu
Presidente, seu país, e seu embaixador, seu exército, sua marinha de guerra,
seus grandes homens de negócios?" Não os pude encontrar e então declarei:
"Eu ajudarei a fazê-los"
Pensamento
de Elijah Muhammad da Nação do Islã sobre a necessidade de um Estado
Independente: “A não ser que a raça
branca aceite a demanda mulçumana pela separação de território para os pretos,
sua raça inteira será destruída e removida da face da terra. E aqueles pretos
que estão tentando integrar-se ao mundo dos brancos, serão inevitavelmente destruídos
juntos com os brancos”.
Não
podemos deixar de destacar a importância de Malcolm X, do Black Panthers
(Panteras Negras) e do movimento do Poder Negro, que teve como maior expoente
Stokely Carmichael, para movimento do nacionalismo preto. Malcolm X, adverso
das estratégias de Martin Luther King, advogada a autodefesa contra a violência
dos brancos e enfatizava o poder politico negro. Os Panteras Negras, criado por
jovens ativista negros, surgiram sobre a influência dos ensinamentos de X, com
o lema “Black Is Beautiful” (Preto é Lindo) e Power The People (Poder Para o
Povo), onde conclamavam a comunidade a se vestir com roupas africanas, usar o
cabelo “crespo” e usar nome africanos ou
islâmicos.
O
movimento de Stokely Carmichael foi mais proeminente no final dos anos
1960 e início dos anos
1970. O movimento enfatizou o orgulho racial e da criação de instituições
culturais e políticos negros para cultivar e promover interesses coletivos,
valores próprios e segura autonomia para os negros.
Importante
frisar que o movimento nacionalista pensado por Malcolm X as vésperas da sua
morte, representou a tentativa de se protagonizar uma nova luta anti racista
nos EUA, onde buscava-se englobar todas as pessoas pretas independente de
religião, partido politico, opção ideológica, etc, trazendo uma noção de emigracionismo mental e uma
autodeterminação racial através da disputa e participação plena na vida social,
política e econômica da sociedade norte-americana.
“Fisicamente os afro descendentes
podem permanecer no Ocidente, lutando por seus direitos constitucionais, mas
filosófica e culturalmente precisam desesperadamente votar para África e
desenvolver uma unidade ativa na estrutura do pan-africanismo.”
Feita essa abordagem histórica do
movimento dos nacionalistas pretos, adentro agora na essência de outra faceta,
que está relacionada aos aspectos que influenciaram a subjetividade das pessoas
pretas e como a compreensão dessa perspectiva pode nos encorajar para um novo
tipo de militância / ativismo negro aqui no Brasil.
Na
história da águia e da galinha citada anteriormente, pudemos perceber que foi o
despertar interior que possibilitou com que a águia recupera-se a memoria de
quem era e das funções naturais que foi criada para desempenhar.
O
ilustre pensador e militante antilhano Franz Fanon dizia: “O colonialismo não se satisfaz apenas em manter um povo em suas garras
e esvaziar a mente do nativo de toda forma e conteúdo; por uma espécie de
lógica pervertida, concentra-se no passado do povo oprimido e o distorce,
desfigura e destrói”
Portanto,
é engano achar que os pretos são oprimidos somente por mecanismos
institucionalizados de um mundo exterior, por meios dos sistemas de justiça,
pelas condições de trabalhos e salários baixos, educação inferior, etc, mas,
sobretudo, pelo estado de alienação, que faz com que o preto rejeite a si mesmo
e relacione o seu opressor branco como tudo que há de positivo na sociedade e
na história da humanidade.
As
organizações e militantes do nacionalismo preto representaram o papel
desempenhado pelo naturalista na história de Agrgrey, qual seja, o papel de
perceber a existência da anormalidade / anomalia na realidade de vida da raça
preta e buscou introjetar dentro do psicológico da mesma uma visão do que
realmente ela é e do que podia fazer de grandioso na face da terra.
O
nacionalismo preto, em todas suas formas e aspectos organizacionais,
representou uma busca pela reconstrução da dignidade e orgulho perdidos através
do processo de escravização. A
escravização causou um processo de esvaziamento mental, espiritual e cultural
nas pessoas pretas, retirando-lhe a noção de humanidade.
Portanto,
objetivando dar uma resposta a essa degradação mental do nosso povo, que não
tinham onde se apoiar, sem ânimo para vivenciar o presente e temendo o futuro,
é que o nacionalismo preto inova nos mecanismos de luta.
Assim,
não foi somente em virtude da necessidade de dar uma resposta a escravização
física e da pobreza material dos africanos que o movimento nacionalista surgiu.
Compreendendo que a escravização e racismo fizeram surgir uma raça composta por
pessoas dominadas, sobretudo psicologicamente, é que o movimento do
nacionalismo preto foca no resgate da verdadeira história de supremacia dos
povos pretos ao longo da história, para a partir daí conclamar a nossa
comunidade a auto aceitação, a auto
valorização, a auto suficiência e organização, ao auto amor e a solidariedade.
O
nacionalismo preto fez surgir então o movimento pelo renascimento racial, onde
o conceito de revolução não estaria ligado somente a mudança das questões
sociais, políticas e econômicas da nossa raça, mas sobretudo por um processo
revolucionário que se origina de uma mudança interior, através de uma nova
postura e do resgate da história, cultura e ancestralidade.
Nesse
sentido, a partir da compreensão de que o homem preto deve ressurgir do lugar
mais profundo da opressão espiritual e psicológica, o nacionalismo preto faz
surgir então um novo homem preto, uma nova mulher preta, enfim, uma nova
família preta, introjetando valores e princípios coesos para unificação, libertação
e auto realização racial.
O
nacionalismo preto, ao expandir pelo mundo, foi importantíssimo na
radicalização da luta dos pretos na África do Sul. Os pensamentos a seguir de
Steve Biko, no chamado da Consciência Preta, representam elementarmente o que
significa esse renascimento preto / essa revolução preta:
“A Consciência Preta é
uma atitude da mente e um modo de vida, o chamado mais positivo que num longo
espaço de tempo vimos brotar do mundo negro. Sua essência é a conscientização
por parte dos pretos da necessidade de unir a seus irmãos em torno da causa de
sua opressão – a negritude de sua pele –
e de trabalharem como um grupo para se libertarem dos grilhões que os prendem a
uma servidão perpétua. Baseia-se num auto exame que os levou finalmente a
acreditar que, ao tentarem fugir de si mesmos e imitar o branco, estão
insultando a inteligência de quem os criou como pretos.”
“Precisamos eliminar de
imediato a ideia de que a Consciência Negra é apenas uma metodologia ou um meio
para se conseguir um fim. O que a consciência Negra procura fazer é produzir,
como resultado final do processo, pessoas negras de verdade que não se considerem
meros apêndices da sociedade branca. Essa verdade não pode ser revogada. Não
precisamos pedir desculpas por isso, porque é verdade que os sistemas brancos
vêm produzindo em todo mundo grande número de indivíduos sem consciência de que
também são gente. Nossa fidelidade aos valores que estabelecemos para nós mesmo
também não pode ser revogada, pois sempre será mentira aceitar que os valores
brancos são necessariamente os melhores. Chegar a uma síntese só é possível com
a participação na política de poder. Num dado momento, alguém terá que aceitar
a verdade, e aqui acreditamos que nós é que temos a verdade."
Importante
frisar, que os movimentos nacionalistas no geral possuem um fundamento
religioso forte, com base na religião cristã, ou islâmica, ou hebraica. Por ser
um movimento de forte influência messiânica, uma das formas de tentar elevar a
mente do povo preto foi através do processo de demonização da raça branca.
Através
do processo de demonização dos brancos, o que se buscava era o desencantamento
racial, aquela ideia de que os brancos são superiores e que os pretos são uma
aberração da humanidade.
O
nacionalismo preto, através dos ensinamentos religiosos, eleva a condição dos
negros para o status de seres angelicais, dotados de uma inteligência e beleza
superior que não são perceptíveis em virtude da destruição cultural a qual
foram submetidos pela opressão branca.
Ser
filhos de Deus e os seres originais significa que foram criados a imagem e
semelhança espiritual, física e mental Daquele, para protagonizar a história e
conduzir toda a humanidade ao desenvolvimento e a felicidade plena.
A
partir então dessa necessidade da reconstrução histórica e cultural é que iniciativas
nas áreas das ciências humanas e exatas começam a ser desenvolvidos na linha da
afrocentricidade ou afrocentrismo, desvendando a verdadeira história de
grandiosidade e domínio dos pretos desde a criação e desenvolvimento da
humanidade.
Ainda,
a partir do levante psicológico, o nacionalismo preto propõe uma forma de
atuação na vida social bem peculiar, conclamando o nosso povo para organizar
instituições fortes, que influenciem e protejam os interesses da nossa própria
raça.
O
nacionalismo preto constitui-se numa base ideológica para o soerguimento da
comunidade preta através do estabelecimento de um processo de autonomia
institucional, ou seja, fazer com os pretos passassem a fazer sua melhoria na
sociedade sem depender dos instrumentos e forma de sobrevivências ofertadas
pelo homem branco.
Daí
buscou-se um planejamento interno próprio da comunidade negra, contrapondo-se a
política de integração racial, a readequação de formas de atuação políticas
através de uma política assistencial material e de uma economia coletiva forte.
Por
exemplo, no Brasil, o movimento negro e as pessoas negras no geral, tem uma
perspectiva de militância que passa necessariamente, devido a influência das
teorias ditas de “esquerda”, por acreditar na intervenção do estado na melhoria
de condições de vida do nosso povo. Daí, passamos décadas acreditando que uma
participação efetiva nas esferas de poder do país, traria muitas melhorias e
respostas positivas para as condições de subalternidade do nosso povo.
Enquanto
o movimento negro no Brasil tomou para si essa única perspectiva de luta,
objetivando angariar o apoio do estado para a concretização das várias
reinvindicações necessária para melhoria das pessoas pretas, muitas coisas
foram deixadas de lado, como por exemplo, a questão da autonomia da nossa
comunidade e do renascimento interior das pessoas pretas a partir delas mesmas.
Para
elucidar melhor o que está sendo dito, pensemos sobre a luta do movimento negro
para implementar a Lei 10.639. Enquanto reivindicamos para um estado branco
genocida, manipulador e corrupto que ações políticas na área educacional sejam
implantadas ou implementadas, deixamos de lado a possibilidade de obtermos
êxitos maiores para nossas pautas se nos organizássemos e tentássemos construir
escolas pretas em nossa comunidade, onde poderíamos gestar um projeto
pedagógico próprio.
Enquanto
reivindicamos participações de pessoas negras nos postos de trabalhos nas lojas
privadas, enquanto trabalhadores / empregados, esquecemos que poderíamos
construir empreendimentos pretos que pudessem absolver uma mão de obra de
trabalho, empregando nossa gente e implementando e fortalecendo um projeto
econômico para nosso povo.
Outro
ponto importante é sobre a questão da violência racial que se abate sobre nossa
gente aqui no Brasil. Enquanto lamentamos as mortes de pessoas pretas em nossas
comunidades e exigimos que o Estado pare a matança da nossa gente, esquecemos
que a política do genocídio também existe em virtude do ódio assimilado pelo
racismo em nós contra nós mesmos.
É
fato que assim como nos Estados Unidos, desde 1976, os pretos são responsáveis
por ¼ das mortes de um milhão de pessoas do nosso próprio povo, no Brasil esses
dados estáticos não são diferentes, quem sabe, até mais elevado.
Assim,
os movimentos nacionalistas pretos procuram introjetar em nossas comunidades
uma valorização da sua história, um amor próprio, autoestima e uma elevação da
visão diante da vida e de seus problemas.
A
Nação do Islã, maior organização do nacionalismo preto da atualidade com cerca
de 2 milhões de seguidores ou simpatizantes, faz um trabalho de enviar seus
militantes para as comunidades negras onde a violência impera para reeducar
jovens envolvidos com o crime, drogas e toda a espécie de autodestruição.
Então,
ao invés de suplicar somente para que a matança causada por um estado branco
genocida pare e que toda espécie de ação humanitária seja feita, o nacionalismo
preto propõe a restituição do espelho quebrado pelo racismo, objetivando frear
essa política genocida que impera em nossas comunidades.
As
iniciativas que o movimento do nacionalismo preto propõe, vem justamente nos
livrar da dependência do nosso opressor para resolução dos nossos problemas,
nos devolvendo a capacidade de nos articularmos e fazermos algo por nós mesmos.
Vale
a pena então citar os seguintes pensamentos de Marcus Garvey:
"A confiança de
nossa raça no progresso e realizações dos outros na expectativa de obter
simpatia, justiça e direitos é como depender de uma bengala quebrada, onde o
apoiar-se nela significará uma eventual queda no chão.”
“A maior arma usada contra o negro é a
desorganização”.
“Se você não confia em
você mesmo, você é duas vezes um derrotado. Com confiança, você já ganhou antes
mesmo de ter começado”
Se 400 milhões de negros
pudessem somente conhecer a si mesmos, saber que neles há uma força soberana,
uma autoridade absoluta, então nas próximas vinte e quatro horas nós teríamos
uma nova raça, nós teríamos uma nação, um império - ressurgido não pela vontade
dos outros de nos ver crescer, mas por nossa
própria determinação para crescer, independente do que o mundo pensa."
Portanto,
entender o nacionalismo preto é importante para que nós possamos enxergar
outras formas de vivenciar novas formas de vida em sociedade e de luta. Como
assinalou Marcus Garvey:
“O negro que vive de
patronagem e filantropias é o mais perigoso membro da sociedade, porque ele
esta disposto a voltar o relógio do progresso quando seus benfeitores lhe pedir
para fazer”.
E
segue em seus ensinamentos:
“Se o negro não for
cuidadoso, ele beberá todo o veneno desta civilização moderna desta civilização
moderna e morrerá do efeito disso”
Nessa
busca pelo resgate do nosso orgulho, valor, estima e amor próprio, é importante
trazer à baila a importância dos valores e princípios do movimento nacionalista
pensado por Maulana Ron Karenga, mentor da celebração afrocêntrica da Kwanzaa.
Assimilação
desses ideais podem ajudar a nós afros diaspóricos no Brasil a começar a trilhar
o caminho das mudanças necessárias para fazer alvorecer um novo tempo de luta e
de vida para nossa gente. Enquanto ainda não somos capazes de dar uma resposta
institucional ao racismo, precisamos entender que o papel de cada indivíduo
preto, o professor, o médico, o advogado, o comerciante, o estudante, os
artistas, etc, tem um lugar importante nessa revolução, qual seja, de sermos as
bases de sustentação para a formação de uma nação negra forte e unificada.
Abaixo, o
significado dos setes valores fundamentais da Kwanzaa:
a)Umoja = unidade;
b)kujichagulia = auto-determinação;
c)Ujima = trabalho coletivo e responsabilidade;
d)Ujamaa = cooperativismo econômico;
e)Nia = objetivo;
f)Kuumba = criatividade;
g)Imani = fé.
Estes princípios estão relacionados com os fundamentos comunitários africanos
da: a) recolha das colheitas; b) reverência; c) comemoração; d) reconhecimento;
e) festa.
a) um tempo de recolha das colheitas e de reafirmação dos laços entre os
membros da comunidade.
b) um tempo de reverenciar ao Criador em agradecimento e respeito pelas bênçãos,
benignidades e beleza da criação.
c) um tempo para comemoração do passado em busca de suas lições e em honra de
seus modelos de excelência humana, os nossos antepassados
d) um tempo do reconhecimento dos mais altos ideais da comunidade para formar
um melhor pensamento africano e uma mais perfeita prática cultural.
e) um tempo para festejar o bom, o bom da vida e da existência em si, o bom da
família, da comunidade e cultura, o bom fabuloso e ordinário, em outras
palavras, o bom divino, natural e social.
Então,
os sete elementos intrisicamente ligado ao nacionalismo preto que devemos começar
a lutar para estabelecer são, portanto: Redenção, Educação, auto-realização,
própositos, economia, comunidade e traição, elementos esses já vivenciados ao
longo dos séculos pelos antepassados da nossa gente aqui no Brasil, seja pela
formação das comunidades quilombolas, seja pelas inúmeras revoltas e rebeliões,
seja pela criação das organizações religiosas e secretas, seja, em tempos
recentes, por iniciativas oriundas da
Frente Negra Brasileira
A FAMÍLIA PRETA
Não
há como se falar num novo amanhecer para o povo preto no Brasil se não
enfrentarmos de fato essa política de miscigenação racial ou de
embranquecimento. O movimento nacionalista faz ressurgir uma valorização da
chamada instituição família preta (homem, mulher e filhos), conclamando ao
nosso povo para não mantermos relações mistas objetivando a auto preservação do
nosso povo.
Essa
ideia realmente deve ser levada a sério por nós pretos aqui no Brasil, tendo em
vista que o processo de diluição da pigmentação preta está bastante elevada
pelas relações raciais compulsórias. Assim, o renascimento preto neste país
deve passar pela compreensão de que devemos nos manter coesos e buscarmos a
realização sentimental e matrimonial entre nós.
A
família preta, portanto, é a organização essencial e fundamental da comunidade
africana. É através do seio familiar que nós preservamos a herança, a cultura,
a história e a integridade do nosso povo. A reconstrução da família preta é
sinônimo de reconstrução da comunidade preta dilacerada pelo racismo e pelo
supremacismo branco. O núcleo familiar é cerne da revolução preta.
“Sim, nós estimamos as
dores do passado, e nós vamos trabalhar no presente para que as dores de nossa
geração não sejam perpetuadas no futuro pelas gerações vindouras. Ao contrário,
nós vamos nos empenhar para que as gerações futuras nos chamem de abençoados,
assim como nós chamamos as nossas gerações passadas. Elas foram abençoadas com
uma paciência jamais conhecida pelo homem. Uma paciência que permitiu que eles
suportassem as torturas e sofrimentos da escravidão por anos. Porque? Será que
foi porque eles gostaram da escravidão? Não! Foi porque eles amavam esta geração
- isto não é maravilhoso.Transcedental!”.
“O que vamos fazer para mostrar nosso apreço por tal amor, que gratidão vamos
manifestar em resposta ao que eles nos tem feito? De minha parte, sabedor do
sofrimento de meus antepassados, eu procurarei dar a África, aquela liberdade
que ela conheceu centenas de anos atrás, antes de seus filhos e filhas terem
sidos arrancados de suas costas e trazidos à correntes para o ocidente. Nenhuma
dádiva melhor posso eu dar em honra a memória e ao amor que meus antepassados
me dedicaram. Em gratidão ao sofrimento que eles surportaram e de que hoje sou
livre, nenhuma dádiva maior posso eu oferecer a sagrada memória de nossa
geração passada do que uma África liberta e redimida - um monumento para a
eternidade - para todos os tempos..."
MAYA ANGELOU - AINDA
ASSIM, EU ME LEVANTO
VOCÊ PODE ME RISCAR DA HISTÓRIA
COM MENTIRAS LANÇADAS AO AR.
PODE ME JOGAR CONTRA O CHÃO DE TERRA,
MAS AINDA ASSIM, COMO A POEIRA, EU VOU ME LEVANTAR.
MINHA PRESENÇA O INCOMODA?
POR QUE MEU BRILHO O INTIMIDA?
PORQUE EU CAMINHO COMO QUEM POSSUI
RIQUEZAS DIGNAS DO GREGO MIDAS.
COMO A LUA E COMO O SOL NO CÉU,
COM A CERTEZA DA ONDA NO MAR,
COMO A ESPERANÇA EMERGINDO NA DESGRAÇA,
ASSIM EU VOU ME LEVANTAR.
VOCÊ NÃO QUERIA ME VER QUEBRADA?
CABEÇA CURVADA E OLHOS PARA O CHÃO?
OMBROS CAÍDOS COMO AS LÁGRIMAS,
MINHA ALMA ENFRAQUECIDA PELA SOLIDÃO?
MEU ORGULHO O OFENDE?
TENHO CERTEZA QUE SIM
PORQUE EU RIO COMO QUEM POSSUI
OUROS ESCONDIDOS EM MIM.
PODE ME ATIRAR PALAVRAS AFIADAS,
DILACERAR-ME COM SEU OLHAR,
VOCÊ PODE ME MATAR EM NOME DO ÓDIO,
MAS AINDA ASSIM, COMO O AR, EU VOU ME LEVANTAR.
MINHA SENSUALIDADE INCOMODA?
SERÁ QUE VOCÊ SE PERGUNTA
PORQUÊ EU DANÇO COMO SE TIVESSE
UM DIAMANTE ONDE AS COXAS SE JUNTAM?
DA FAVELA, DA HUMILHAÇÃO IMPOSTA PELA COR
EU ME LEVANTO
DE UM PASSADO ENRAIZADO NA DOR
EU ME LEVANTO
SOU UM OCEANO NEGRO, PROFUNDO NA FÉ,
CRESCENDO E EXPANDINDO-SE COMO A MARÉ.
DEIXANDO PARA TRÁS NOITES DE TERROR E ATROCIDADE
EU ME LEVANTO
EM DIRECÇÃO A UM NOVO DIA DE INTENSA CLARIDADE
EU ME LEVANTO
TRAZENDO COMIGO O DOM DE MEUS ANTEPASSADOS,
EU CARREGO O SONHO E A ESPERANÇA DO HOMEM ESCRAVIZADO.
E ASSIM, EU ME LEVANTO
EU ME LEVANTO
EU ME LEVANTO.
MAYA ANGELOU – POETISA AFRO-AMERICANA
O PORGRAMA DOS DEZ PONTOS DOS PANTERAS NEGRAS
1- Queremos liberdade. Queremos o poder para determinar o
destino de nossa Comunidade Negra.
Nós acreditamos que o povo preto não será livre até que nós
sejamos capazes de determinar nosso destino.
2- Queremos emprego para nosso povo.
Nós acreditamos que o governo federal é responsável e
obrigado a dar a cada homem emprego e renda garantida. Nós acreditamos que se o
homem de negócios americano branco não nos dá emprego, então os meios de
produção devem ser tomados dos homens de negócios e ser colocados na comunidade
de modo que o povo da comunidade possa organizar e empregar todas as pessoas e
dar-lhes um padrão elevado de vida.
3- Precisamos acabar com a exploração do homem branco na
Comunidade Negra.
Nós acreditamos que este governo
racista tem nos explorado e agora nós estamos demandando a quitação do débito
de quarenta acres de terra e duas mulas. Quarenta acres e duas mulas foram
prometidos 100 anos atrás em restituição pelo trabalho escravo e assassinato em
massa do povo preto. Nós aceitaremos o pagamento em moeda corrente, que será
distribuída às nossas muitas comunidades. Os Alemães estão agora reparando os
Judeus em Israel pelo genocídio do povo Judeu. Os Alemães assassinaram seis
milhões de Judeus. O Racista Americano tomou parte no massacre de mais de vinte
milhões de pessoas pretas; consequentemente, nós sentimos que esta é uma
demanda modesta que nós fazemos.
4- Nós queremos moradia, queremos um teto que seja adequado
para abrigar seres humanos.
Nós acreditamos que se os
senhores de terra brancos não dão moradia descente para a nossa comunidade
negra, então a moradia e a terra devem ser transformadas em cooperativas de
maneira que nossa comunidade, com auxílio governamental, possa construir e
fazer casas descentes para as pessoas.
5- Nós queremos uma educação para nosso povo que exponha a
verdadeira natureza da decadente sociedade Americana. Queremos uma educação que
nos mostre a verdadeira história e a nossa importância e papel na atual
sociedade americana.
Nós acreditamos em um sistema
educacional que dê a nossos povos um conhecimento de si mesmo. Se um homem não
tiver o conhecimento de si mesmo e de sua posição na sociedade e no mundo,
então tem pouca possibilidade relacionar-se com qualquer outra coisa.
6. Nós queremos que todos os homens negros sejam isentos do
serviço militar.
Nós acreditamos que o povo preto
não deve ser forçado a lutar no serviço militar para defender um governo
racista que não nos protege. Nós não lutaremos e mataremos os povos de cor no
mundo que, como o povo preto, estão sendo vitimizados pelo governo racista
branco da América. Nós nos protegeremos da força e da violência da polícia
racista e das forças armadas racistas, por todos os meios necessários.
7. Nós queremos o fim imediato da brutalidade policial e
assassinato do povo preto.
Nós acreditamos que nós podemos
terminar a brutalidade da polícia em nossa comunidade preta organizando grupos
pretos de autodefesa que são dedicados a defender nossa comunidade preta da
opressão e da brutalidade racista da polícia. A segunda emenda da Constituição
dos Estados Unidos dá o direito de portar armas. Nós acreditamos consequentemente
que todo o povo preto deve se armar para a autodefesa.
8. Nós queremos a liberdade para todos os homens pretos
mantidos em prisões e cadeias federais, estaduais e municipais.
Nós acreditamos que todas as
pessoas pretas devem ser liberadas das muitas cadeias e prisões porque não
receberam um julgamento justo e imparcial.
9. Nós queremos que todas as pessoas pretas quando trazidos
a julgamento sejam julgadas na corte por um júri de pares do seu grupo ou por
pessoas de suas comunidades pretas, como definido pela Constituição dos Estados
Unidos.
Nós acreditamos que as cortes
devem seguir a Constituição dos Estados Unidos de modo que as pessoas pretas
recebam julgamentos justos. A 14ª emenda da Constituição dos ESTADOS UNIDOS dá
a um homem o direito de ser julgado por pares de seu grupo. Um par é uma pessoa
com um acumulo econômico, social, religioso, geográfico, ambiental, histórico e
racial similar. Para fazer isto a corte será forçada a selecionar um júri da
comunidade preta de que o réu preto veio. Nós fomos, e estamos sendo julgados
por júris todo-brancos que não têm nenhuma compreensão "do raciocínio do
homem médio" da comunidade preta.
10. Nós queremos terra, pão, moradia, educação, roupas,
justiça e paz. E como nosso objetivo político principal, um plebiscito
supervisionado pelas Nações-Unidas a ser realizado em toda a colônia preta no
qual só serão permitidos aos pretos, vítimas do projeto colonial, participar,
com a finalidade de determinar a vontade do povo preto a respeito de seu
destino nacional.
As
três cores representam:
a)
vermelho: o sangue que une todo o povo de
ascendência Africana e que foi derramado pela libertação;
c)
Verde:
a abundante e diversa riqueza natural das terras africanas
"Todos nós somos dotados, mas nós
temos que descobrir o dom, descobrir o dom, cultivar e desenvolver o dom e
usá-lo para a glória de Deus e para a luta de libertação do nosso povo”.
Louis Farrakhan
Referencias
bibliográficas:
O
PODER NEGRO – E.U. ESSIEN – UDOM
ESCREVO
O QUE QUE QUERO – STEVE BIKO
EL
NACIONALISMO NEGRO EM ESTADOS UNIDOS – THEODORE DRAPER
NEGRO DA
AMERICA – ROI OTTLEY
Nenhum comentário:
Postar um comentário